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livro Zonas de Contato: Usos e abusos de uma estética do corpo

 

   "Há muito tempo a produção artística cansou-se de critérios e orientações externas aos seus corpos. Há muito tempo os processos pedagógicos, os procedimentos didáticos também manifestam exaustão em relação às condições criadas fora dos seus corpos e acontecimento. Políticas educacionais aqui se aproximam e assemelham aos critérios de legitimação artística oriundos de um sistema mais fraterno ao mercado que sensível à poética.

   Contudo, nesse plano de exaustão notável fertilidade acontece. Em outros termos, do cansaço decorrente do enfrentamento contínuo às programações políticas e mercadológicas - inevitáveis e oportunas iniciativas no campo das artes e da educação, ambas compromissadas com a formação humana em sintonia com a atualidade local, global e seus atravessamentos - formulam dinâmica tão indisciplinada quanto espontânea e retomam territórios interditados, desfazem fronteiras e assumem complexidades marginalizadas ou negadas.

   Complexidades evidenciadas, por exemplo, nas relações e amálgamas entre a ação de criar arte e a autopoiesis dos seres humanos meio aos espaços, tempos e narrativas de função e forma tanto poética quanto epistêmica. Atos poéticos que evidenciam o corpo encarnado como suporte, forma e conteúdo estéticos e fonte de saberes sempre partilháveis, sempre produto de diferenças e transformáveis em função do alcance sempre maior e coletivo.

   Essas ponderações buscam alcançar um pouco da grandeza e amplitude da obra multifacetada que é o projeto Zonas de Contato, aqui realizado em livro. Zonas de Contato, por meio de experiências diversas e interconectadas, expõe a potência do corpo evitado e muito negado nas edições autorizadas ao longo da história hegemônica da arte. O corpo que em sua ação poética se arremessa contra todos os sistemas e forças políticas que pretendam colonizá-lo e negar ou abrandar a sua potência maior que reside na epiderme coletiva.

   Organismo que ferido pelas exclusões e demais aviltamentos de ordem individualizante, tatua denúncias na face dos individualistas e ilumina os corpos sensuais na exuberância dos coletivos. Zonas de Contato, entre tantas forças, encanta com a ativação da memória de que todo corpo é inexoravelmente epiderme coletiva e patrimônio coletivo. Noção eclipsada, mas, não destruída, pela imposição de categorias adversas à autonomia da carne e do desejo, como o gênero, o bem, o mal, o centro, a periferia, etc.. E é na linguagem artística da performance, força e plataforma de projeção poética das Zonas de Contato, que a blindagem da representação se dilui e os planos existenciais se enredam em acontecimentos artísticos em eloquente diálogo com os tempos de agora."

Aldo Victório 

 

​© 2014 por Performa(ti)cidades

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